Obsolescência Programada


lampada-600x450No início, os produtos eram feitos para durar… Porém, no início da década de 1920, um grupo de empresários constataram o seguinte: “Um produto que se recusa a desgastar-se, é uma tragédia para o negócio” (1928). Assim nasceu a “Obsolescência Programada”.

Pouco depois, foi criado o primeiro cartel do mundo especificamente para reduzir a vida útil das lâmpadas incandescentes, um símbolo de inovação e de novas ideias brilhantes, e a primeira vítima oficial da obsolescência planeada.

Na década de 1920 cada lâmpada durava em média 2500 horas. Hoje elas aguentam, em média, cerca de 1000 horas. A tecnologia actual, contudo permitiria uma duração de pelo menos 35.000 horas, exactamente pelo mesmo preço!!! Essa diferença acontece porque os fabricantes acordaram que elas deveriam “morrer” mais rápido para que os consumidores precisassem comprar mais.

Em alguns casos, como nas impressoras de computador, um contador de impressões bloqueia a impressora ao fim de um número pré definido de cópias, indicando falha de uma peça, e sugerindo o recurso ao vendedor… que obviamente lhe indica que fica mais cara a reparação que a compra de uma nova. Só que você está a ser enganado: a impressora não tem nenhuma avaria! Simplesmente atingiu o numero pré determinado pelo fabricante para ser transformada em lixo!

Ao processo que predetermina a transformação em lixo de qualquer produto ao fim de um número pré determinado de utilizações chama-se obsolescência programada.

10Isto acontece com a maioria do produtos que você compra hoje em dia: eles são fabricados especificamente para avariarem, ou durarem pouco. Com isso o fabricante sabe que lhe vai voltar a vender e que você voltará a pagar por um produto que afinal já tinha adquirido. Em muitas situações o produto dura exactamente o tempo que demora a ser pago. Depois simplesmente deixa de funcionar, avaria, ou estraga-se como por milagre.

Já o comprador, é enganado, comprando apenas produtos de qualidade muito inferior. Você, o comprador, ficará eternamente a pagar repetidamente por um produto que deveria ter adquirido uma única vez e que poderia funcionar por muitos anos em boas condições, se não estivesse perversamente armadilhado para falhar numa data específica.

E por este processo são todos os anos geradas milhões de toneladas de lixo e detritos que progressivamente destroem o planeta, são consumidos recursos naturais não renováveis em quantidades assustadoras, e tudo para o lucro  capitalista dos fabricantes. O consumidor é enganado, adquire produtos preparados para serem de fraca qualidade, e o planeta destruído.

É a obsolescência programada!!!

Como surgiu

A obsolescência programada faz parte de um fenómeno industrial e do mercado de consumo surgido nos países capitalistas nas décadas de 1930 e 1940 conhecido como “cartelização”. Faz parte de uma estratégia de mercado que visa garantir um consumo constante através da insatisfação, de forma que os produtos que satisfazem as necessidades daqueles que os compram parem de funcionar ou se tornem obsoletos num curto espaço de tempo, tendo que ser obrigatória e periodicamente substituídos por outros mais modernos.

A obsolescência programada foi criada, na década de 1920, pelo então presidente da General Motors Alfred Sloan. “Um produto que se recusa a desgastar, é uma tragédia para o negócio” (1928).

Então ele procurou atrair os consumidores a trocar de carro frequentemente, tendo como apelo a mudança anual de modelos e acessórios.

O exemplo multiplicou-se e estendeu-se a quase toda a produção industrial moderna, nuns casos de forma mais ou menos dissimulada, sendo a pressão de compra criada simplesmente pela indução da sensação de desactualização (neste caso chama obsolescência perceptiva), como é o caso dos telemóveis, sempre com modelos ditos “novos”…

… noutros casos por motivos técnicos reais (a que se chama obsolescência técnica) em que a desactualização do produto se fica a dever a novidades tecnológicas que efectivamente tornam produtos mais antigos menos funcionais, como é o caso, por exemplo da recente introdução da televisão digital terrestre, que tornou obsoletos centenas de milhares de televisores perfeitamente operacionais…

… mas noutros casos de forma perfeitamente artificial, pelo simples uso de processos, materiais  de fabrico ou engenharia de produção que provocam a falha intencional do produto, antes daquilo que seria natural acontecer, caso em chamamos obsolescência programada, como ocorre, por exemplo nas máquinas de lavar domésticas, que usam metal de qualidade propositadamente inferior, por forma a que a corrosão lhes limite a duração a uns meros 7 ou 8 anos.

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Mas outro exemplo, talvez menos claro, é o da Microsoft e outros fabricantes de software, que desde cedo também adoptaram esta estratégia de negócio nas actualizações do Windows, em que mesmo sem qualquer modificação ou actualização significativa, novas versões substituem anteriores a um ritmo programado, e contendo em si “engenharia” suficiente para provocar  a incompatibilidade irremediável das versões mais antigas com as aplicações e usos mais recentes.

O consumidor não ganha nada: apenas volta a comprar o que já tinha.

A industria automóvel

O uso de peças com uma duração previamente programada, preparadas para falharem ao fim de um numero predeterminado de utilizações, ou de materiais menos resistentes é uma das estratégias da obsolescência programada. Mas não é a única.

Exemplos há em que a substituição de produtos é simplesmente induzida de forma psicológica. Neste caso é criada no consumidor a sensação de desactualização: periodicamente novos produtos, em quase tudo funcionalmente semelhantes aos anteriores,  são lançados acompanhados por uma campanha que transforma os anteriores em produtos do passado.

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Muitas vezes são usados chavões técnicos que nenhum consumidor entende, ficando no entanto com a sensação de que se não substituir o produto vai perder algo. Na maior parte dos casos nenhuma melhoria funcional é introduzida! O consumidor não ganha nada pela substituição. Apenas vai pagar de novo o que já tem.

Durante a década de 1950, com o nascimento da sociedade de consumo, o conceito adquiriu um significado completamente novo, como explica o designer flamboyant Brooks Stevens:

“obsolescência planeada, o desejo de possuir alguma coisa um pouco mais recente, um pouco melhor, um pouco mais cedo do que necessário…”

… e o conceito estendeu-se ainda mais: a criação do desejo de substituir inclusivamente o que ainda é perfeitamente funcional e útil!!!

japanesevehiclemakersreducecarproductions2ih9wivkezxUm caso flagrante é o da industria automóvel, que rapidamente transformou um ciclo de substituição de produtos que teria uma duração natural de uma dezena de anos, por um ciclo mais curto de 2 ou 3 anos.

Que mal tem o automóvel familiar com dois anos? Porquê substitui-lo ao fim desse tempo? Provavelmente mal nenhum!!! É um produto em perfeito estado de uso. Simplesmente já está pago! E o fabricante necessita de vender um novo produto.

O mesmo se passa, por exemplo, com os telemóveis. É a campanha publicitária e o marketing muitas vezes indutor de graves equívocos no consumidor, que induz a necessidade de compra. Nada mais.

O impacto ambiental

Ainda que sendo uma manipulação do consumo, que induz o consumidor em erro, obrigando-o a permanente readquirir o que já possuía, tudo isto seria pouco grave se não tivesse consequências muito mais vastas do que simplesmente fornecer produtos de mais baixa qualidade e obrigar o consumidor a pagar de novo, apenas para enriquecimento do fabricante.

d3766cd2fd4948d88bd84264d1332470A questão principal é de facto o impacto ambiental tremendo que esta actuação tem! E este impacto ocorre por de facto por duas vias : por uma via directa, em que os produtos ainda em estado de utilização, se transformam inexoravelmente em lixo, em detritos, e em enormíssima percentagem não reciclados.

Uma segunda via, tão grave como a primeira, é pelo consumo de novas matérias primas, recursos naturais, muitas vezes escassos e outras vezes fortemente poluentes, e pelo novo consumo de energia para o seu fabrico mas principalmente para o seu transporte.

A maioria das pessoas crê que os produtos obsoletos (todas as máquinas, electrodomésticos, electrónica de consumo, roupas, veículos, produtos domésticos, etc,) depois de colocados no lixo, são reciclados. A realidade é completamente diferente. A enormíssima maioria dos produtos obsoletos acaba abandonada na natureza, colocada em aterros sanitários, na melhor das hipóteses.

Na pior hipótese, como é o caso de produtos fortemente poluentes, como os equipamentos electrónicos, que contém desde produtos fortemente tóxicos, e fortemente corrosivos alguns deles, a produtos de longuíssima duração na natureza, com períodos de degradação natural gigantescos, eles são enviada para países de terceiro mundo, onde acabam na natureza transformando aqueles países em enormes lixeiras, contendo detritos perigosíssimos quer para a natureza quer para a vida humana.

A Industria nega!

A industria nega geralmente todas estas práticas. E no entanto a realidade é bem clara. Os produtos bloqueiam e avariam muito acima do que é aceitável, alegadamente sem possibilidade de reparação.

epson-multifuncional-ecotank-l475É o caso das impressoras de computador que, a certo ponto bloqueiam e dão erro. Segundo a assistência técnica da marca é impossível uma reparação a preço aceitável, sendo preferível a compra de uma nova impressora.

Alguns activistas alegam que essa avaria é perfeitamente programada na electrónica pelo fabricante, a qual estará preparada para bloquear a impressora assim que atinge um número x de cópias! A marca nega tal coisa!

Pois os hackers provaram que a “reparação  necessária” é apenas fazer reset ao contador de cópias da impressora (algo que se faz quase sem qualquer custo), que nesse momento passa a funcionar como nova. E esse contador é até inútil para qualquer outro propósito, por muitas explicações que o fabricante tente dar para ele!

A mentira é portanto desmascarada.

r1E os casos multiplicam-se. As máquinas de lavar avariam sistematicamente aos 7 a 8 de idade. Os televisores aos oito ou nove. Os automóveis são descartados aos 7 ou 8 por avarias que se devem ao desgaste, económica e tecnicamente injustificado, de peças que seriam perfeitamente substituíveis, não fosse o custo proibitivo cobrado pela industria nessas peças específicas! A generalidade dos fabricantes fornece lâmpadas que têm um tempo esperado de vida de 1000 horas. A Philips, sem que qualquer nova tecnologia tenha sido introduzida, resolve vender lâmpadas com um tempo esperado de vida de 25.000 horas… etc… etc…

Alguma coisa não bate certo, e só quem não está atento o não percebe.

Inevitável?!

O economista Bernard London foi o primeiro a teorizar sobre a prática. Em 1932, publicou o livro The New Prosperity. O primeiro capítulo deixa claro: “Acabando com a depressão através da obsolescência programada”. Ele sugere que, se as pessoas continuassem comprando, a indústria continuaria crescendo e todos teriam emprego.

pagamento-em-dinheiro“A obsolescência programada sempre faz sentido enquanto você pensa em como manter o crescimento da indústria e a criação de empregos a curto prazo”, diz Cosima. “O problema é a longo prazo. Estamos usando nossos recursos naturais e criando montanhas de lixo. A obsolescência programada funcionou bem no passado, mas estamos começando a ver as consequências. É um sistema que não pode ser usado para sempre.” diz Cosima Dannoritzer que em 2011 lançou um documentário sobre o assunto que chocou os mais atentos em todo o mundo!

Para a directora, a crise mundial mais uma vez pode vir a reflectir-se no comportamento da indústria. Só que, desta vez, ao contrário. Até ao momento a industria procurou vendar sempre mais, provocando a obsolescência programada dos produtos, vendendo produtos programados para avariarem, abaixo da qualidade técnica e economicamente possível. Porém começou a perceber que a situação é insustentável e que os consumidores além de já o terem percebido, começaram também a percepcionar negativamente a curta duração dos produtos.

Na maior feira de tecnologia dos EUA, a Consumer Eletronics Show ou CES, de 2012 começou esta mudança: a par do permanente e sempre extravagante espectáculo de lançamento de novos produtos, modelos e versões, outra tendência ganhou lugar: a da durabilidade dos produtos. Passou quase despercebido, é certo, mas algumas empresas já estão usando uma estratégia de “desobsolescência programada”, como escreveu Lance Ulanoff, editor-chefe do site de tecnologia Mashable.

atualizar-softwareÉ o caso da Samsung que usou uma estratégia de apresentação das suas smart TVs como sendo “à prova de futuro”, e anunciando a possibilidade de actualização de software, além de uma engenharia que permite o fornecimento de kits para se manterem atualizadas. “Claramente a Samsung descobriu que os consumidores não estão tão interessados em TVs de alta definição que ficam desactualizadas ou saem de moda em poucos anos de uso”, escreveu. Outro caso é o do Motorola Droid Razr Max, smartphone Android, cuja bateria é anunciada como capaz de rodar até 15 horas de vídeo com uma única carga, e com uma garantia estendida por um período de tempo bem mais longo que os concorrentes.

“Há empresas que estão vendendo produtos mais duráveis convencendo seus consumidores de que isso é um bom investimento”, diz Cosima. Ela cita no documentário as lâmpadas ultra-duráveis da Philips que ficam acesas por até 25 mil horas. Segundo a assessoria da Philips, os produtos verdes representaram 31% do total das vendas da companhia. E o certo é que foram mais de 800 lançamentos nessa área nos últimos dois anos. Acontece que, com a mais simples tecnologia actual, qualquer fabricante o poderia fazer de igual modo… se não fosse o caso de procurar exactamente o contrário!

Uma mudança na industria? Não se sabe ainda. O certo é que a mudança só ocorrerá quando o consumidor for critico, informado, exigente menos influenciável. E isso não está ainda a acontecer, na maior parte dos casos! Mas só o futuro o dirá.

O documentário original

O documentário The Light Bulb Conspiracy (A conspiração da lâmpada) de Cosima Dannoritzer 2011, com o título em português de Comprar, deitar fora, comprar: A história da obsolescência programada evidencia a prática da obsolescência programada (ou planejada) como o motor da sociedade de consumo

Outros documentários sobre o assunto

Referência

Wikipédia – Obsolescência Programada

Comprar, jogar fora, comprar: A história da obsolescência programada

GIZMODO – Porque seus gadgets duram pouco

Programado para morrer (no Estadão, de São Paulo, BR)

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